Meu Nome é Laura (2024) de Alex Andrade, publicado pela Confraria do Vento, é um romance que mergulha nos labirintos da complexidade familiar e da identidade. A obra é dividida em três partes – Pedro, Pedrinho, e Laura – e explora, com uma profundidade emocional ímpar, as dificuldades de ser pai e a busca por conexão em um ambiente marcado por distâncias emocionais e conflitos de gerações.
A narrativa é rica em introspecção e segue um ritmo reflexivo, capturando os sentimentos de Pedro, o protagonista, em sua relação com o filho Pedrinho e a eventual revelação de Laura, uma personagem que sintetiza as mudanças e as angústias da família. Pedro é um personagem profundamente marcado por seu passado, e seu retrato como pai revela a luta interna para superar os legados de sua própria criação, dominada por uma figura paterna distante e violenta. Esse ciclo de dor e desajuste interpessoal parece se repetir com o próprio filho, Pedrinho, que, com o tempo, manifesta suas dificuldades em lidar com o mundo à sua volta.
O estilo de Alex Andrade combina uma prosa poética e detalhista, que se destaca pela sensibilidade com que aborda temas delicados como masculinidade tóxica, abuso emocional, alcoolismo e as expectativas de gênero. Um dos pontos centrais do livro é a relação entre pai e filho e como essa relação é mediada por pressões sociais e concepções equivocadas de masculinidade. A maneira como o autor constrói os personagens traz à tona questões de vulnerabilidade e a difícil transição para uma paternidade consciente e carinhosa, mesmo quando Pedro luta com suas próprias limitações emocionais.
Andrade também usa a metáfora da névoa, que permeia a narrativa, para sugerir a confusão e o afastamento emocional que separa as gerações. A névoa simboliza não apenas as dificuldades de Pedro em compreender seu filho e a si mesmo, mas também o isolamento que os personagens sentem em suas próprias vidas. As cenas de flashbacks, especialmente aquelas envolvendo o pai de Pedro, retratam a herança de dor e alienação que Pedro tenta desesperadamente quebrar, mas que muitas vezes parece perpetuar involuntariamente.
O tratamento de Pedrinho, que é vítima de bullying e tem uma sensibilidade que o diferencia das expectativas rígidas de masculinidade, destaca a crítica social presente no romance. A narrativa não se limita a retratar o sofrimento de Pedrinho, mas também explora a dificuldade de seus pais, especialmente Pedro, em lidar com sua própria falha em proteger o filho de um mundo cruel e normativo. A violência e a expectativa de força, tanto física quanto emocional, são temas recorrentes que surgem em vários pontos da narrativa, criando um diálogo poderoso sobre a construção social do “ser homem” e as consequências devastadoras de não atender a esses padrões.
Apesar de toda a dor presente, Meu Nome é Laura também é uma história de transformação e descoberta, com a personagem-título Laura aparecendo como um símbolo de liberdade e autocompreensão. A transição de Pedrinho para Laura é tratada de maneira delicada, e o romance celebra a importância da autoaceitação e da identidade de gênero, enquanto desafia as normas sociais e familiares que tentam reprimir a individualidade.
Em termos de estrutura, o livro é bem organizado, com cada parte funcionando quase como um conto independente, mas que, no conjunto, cria uma narrativa coesa e multifacetada. A mudança de perspectiva de Pedro para Pedrinho e, por fim, para Laura, oferece ao leitor uma visão ampla das complexidades da identidade e da luta por aceitação em um ambiente repleto de expectativas rígidas e não negociáveis.
O projeto gráfico, assinado por Pranayama Design, e a revisão cuidadosa de Victor Paes ajudam a manter a fluidez da leitura, enquanto a escolha editorial da Confraria do Vento enriquece o catálogo da editora, que sempre investe em narrativas contemporâneas e inquietantes.
Em suma, Meu Nome é Laura é uma obra impactante que fala profundamente sobre as relações familiares, a identidade de gênero e a busca por aceitação em um mundo que, muitas vezes, não acolhe o diferente. Alex Andrade nos oferece uma visão empática e dolorosa sobre o amor e o sofrimento que marcam as vidas de seus personagens, ao mesmo tempo em que nos faz refletir sobre os limites e as possibilidades do entendimento humano.
Referência
ANDRADE, Alex. Meu nome é Laura. Rio de Janeiro: Confraria do Vento, 2024.
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