(Alentejo seen from the car)
A planície não termina,
um verso calado na boca da terra,
sombra que não afasta o peso do tempo.
Aqui, os campos sonham
em silêncio antigo,
arando o céu com os olhos fechados.
As árvores avançam solitárias,
vagarosas como memórias,
raízes que nunca precisaram
entender o mundo,
apenas carregá-lo.
Suor adentra o solo,
homens, barro moldado pelo vento,
escavados no grito mudo,
erguem a resistência no punho,
feitos de pó e silêncio.
Os caminhos dobram-se
na quietude dos segredos,
guardando o peso das histórias
que se escondem nos sulcos
da estrada sem pressa.
No céu, o murmúrio de almas esquecidas,
perdidas em histórias que só o vento conhece.
Vidas carregadas pela vastidão,
inscritas no espaço onde a terra toca
o nada.
E o vento é tudo,
epopeia que se refaz em cada sopro,
levando consigo as memórias que não cabem
na raiz dos mitos.
Ulisses não parte,
seu regresso é o mesmo de sempre.
Alentejo repousa
no fundo do tempo,
suspenso entre o que foi dito e o que ficou por dizer.
A terra cala os poetas,
pois só ela fala,
e sua voz já basta.
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