Entre a Mancha e o Atlântico – o que o “novo’ acordo EU UK diz ao Brasil e a Portugal

O anúncio do novo acordo [ver foto] entre Reino Unido e União Europeia marca, oficialmente, o início do que Ursula von der Leyen chamou de “um novo capítulo”. Mas para além dos gestos simbólicos, a reaproximação entre Londres e Bruxelas tem implicações concretas — e estratégicas — para os dois lados do Atlântico onde Portugal e Brasil olham, com interesses distintos, o redesenho silencioso da geoeconomia europeia.

Para Portugal, antigo intermediário diplomático entre as ilhas britânicas e o continente, a notícia é um alívio: o Brexit havia desorganizado não apenas as cadeias logísticas, mas o próprio equilíbrio político dentro da União. A recuperação de um canal formal de entendimento entre as partes permite a Lisboa retomar uma função que domina há séculos: ser ponte. Entre o pragmatismo britânico e o idealismo europeu, Portugal poderá ampliar sua influência no novo tabuleiro comercial, defendendo setores que lhe interessam — como o agroalimentar, os vinhos e os serviços — com um pé em cada margem.

Para o Brasil, o sinal é outro: o acordo reafirma que a Europa não está em retração — está em reorganização. E isso exige atenção. Em meio às negociações arrastadas do Acordo Mercosul-UE, a capacidade britânica de redesenhar acordos bilaterais (como o que já firmou com países da África e Ásia) mostra que a diplomacia comercial atlântica está em ebulição. O Brasil, se quiser voltar ao centro do jogo, precisa abandonar a paralisia tática. A hora é de pragmatismo ambicioso — e de escutar os sinais de Londres e Bruxelas como peças de um mesmo xadrez.

A reconciliação britânico-europeia nos lembra que alianças não são dogmas: são ferramentas. O Reino Unido que se afastou da Europa por impulso ideológico retorna por necessidade econômica. Portugal, fiel ao projeto europeu, pode se beneficiar da reconfiguração. O Brasil, se desejar ter voz, precisa falar a linguagem do século XXI: comércio com responsabilidade, política externa com inteligência, e coragem para pensar o Atlântico como espaço estratégico — e não apenas simbólico.

Financial Times| 20.mai.25

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