O amor mudou ou só encontrou novos nomes? Lendo o Libération e a pesquisa do INED sobre os jovens de 18 a 29 anos, percebo que minha geração namorava, casava ou terminava – já a deles prefere sexfriends, situationships e conexões sem rótulos. Parece liberdade, mas será que não é só outra forma de incerteza?
Nos cafés de Paris, nos bares de Lisboa ou nos rooftops de São Paulo, as conversas sobre relacionamentos entre os jovens de hoje parecem ter mudado radicalmente desde que minha geração, nascida no século passado, experimentou os primeiros amores. O que antes se chamava namoro ou casamento agora se dissolve em novas terminologias: sexfriends, amimour, situationships. As palavras são diferentes, mas a busca parece a mesma: conexão, desejo, e talvez – por que não? – um pouco de pertencimento.
Para alguém da minha idade, um homem branco de meia-idade que viu o amor ser ensinado como uma construção linear – conhecer alguém, namorar, casar, talvez ter filhos – o que vejo hoje desperta mais curiosidade do que reprovação. A forma como os jovens se relacionam parece um experimento contínuo, um laboratório social onde as regras estão em constante revisão. Não há mais fórmulas prontas, nem contratos implícitos. Mas o que isso significa na prática?
A reportagem do Libération e a pesquisa do INED sobre a vida afetiva dos jovens mostram que os relacionamentos contemporâneos estão mais fluidos, misturando amizade e desejo de formas que minha geração não teria imaginado. O relato de Nora, por exemplo, é emblemático: um envolvimento profundo, mas sem rótulos, sem a segurança de um “sim” definitivo, nem a clareza de um “não” irrevogável. Uma história que começa no Instagram, se desenrola em encontros espaçados, e se prolonga em um limbo emocional que parece caracterizar muitos relacionamentos atuais.
A questão religiosa e cultural também persiste. Aaron, o rapaz com quem Nora se relaciona, sente o peso das expectativas familiares. O desejo de liberdade pode esbarrar em tradições que não se dissolvem tão facilmente. Isso mostra que, apesar da revolução nos costumes, algumas amarras culturais continuam presentes, talvez porque, no fundo, todos precisem de alguma referência, de algum lugar seguro para ancorar o afeto.
Os dados da pesquisa sugerem que os jovens não rejeitam o amor nem a intimidade, mas redefinem suas fronteiras. O compromisso agora se constrói de maneira menos explícita, mas nem por isso menos intensa. Talvez essa geração apenas tenha desistido da ilusão de controle total sobre os sentimentos – algo que, sejamos honestos, minha geração também nunca teve, só fingia ter.
Se há algo que minha experiência me ensinou, é que cada época reinventa o amor à sua maneira. Meus pais viveram relações moldadas pelo dever, minha geração buscou equilíbrios entre paixão e estabilidade, e os jovens de hoje parecem rejeitar qualquer manual pronto. Eles podem estar certos: o amor talvez nunca tenha sido uma equação exata.
O que me pergunto é se essa liberdade emocional, essa recusa em definir as coisas, torna os relacionamentos mais leves ou mais exaustivos. O desejo de evitar rótulos pode ser uma forma de proteção, mas também pode criar uma espécie de loop emocional, onde ninguém sabe ao certo onde pisa.
Observo tudo isso com curiosidade, sem nostalgia excessiva nem pessimismo gratuito. Os jovens talvez estejam apenas tentando resolver, do jeito deles, o mesmo dilema que sempre acompanhou a humanidade: como conciliar desejo e afeto, liberdade e segurança, independência e pertencimento. No fundo, eles podem não estar tão distantes assim de nós. Talvez apenas tenham decidido trocar o roteiro da peça, sem abrir mão da trama principal.

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