Poucos filmes ousam dramatizar o invisível.
Conclave não apenas ousa — ele desvela. Com a precisão de uma lâmina simbólica, revela o que raramente temos coragem de encarar: o momento em que a fé precisa decidir entre o silêncio e a verdade.
Poucos filmes se permitem o risco de dramatizar o coração invisível da Igreja Católica. Menos ainda o fazem com a intensidade e a precisão simbólica de Conclave, longa-metragem recentemente estreada e candidata aos Óscares, que, mesmo partindo da ficção — nos dá a ver, e a sentir — o que raramente ousamos pensar: o que significa, de verdade, escolher um Papa.
O filme é uma parábola moderna, de uma beleza austera, quase cruel. Não pela sua estética, mas pelo modo como escava as contradições internas do catolicismo contemporâneo — entre tradição e transparência, entre dogma e humanidade, entre espiritualidade e poder.
O personagem central, inspirado em um cardeal fictício chamado Lomeli, vive o dilema de ser fiel à verdade ou obedecer à instituição. E este é, talvez, o dilema do nosso tempo: quando o mundo exige clareza, a Igreja continua a falar em silêncio.
Conclave é, antes de tudo, um espelho da angústia atual. A sucessão papal — iminente com a morte recente do Papa — é um acontecimento político, espiritual e civilizacional. Quem sucederá o Papa que colocou os pobres no centro da mesa, mas que muitos viram como tímido diante dos autoritarismos? Quem guiará a Igreja num tempo em que a fé compete com algoritmos?
A ficção do filme — com suas intrigas e revelações íntimas — não visa atacar o Vaticano, mas iluminar suas sombras. Ali onde a fé deveria ser pura, existe cálculo. Ali onde deveria haver reconciliação, há divisão. E isso não é apenas da Igreja: é do mundo.
Num momento em que a Igreja se vê obrigada a reencontrar a sua voz, Conclave oferece uma narrativa que, ainda que ficcional, ressoa com o real. Porque escolher um Papa é escolher uma direção para milhões — e talvez seja também escolher que mundo queremos habitar.

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