Hoje o mercado imobiliário já não é mais localização, localização, localização. Hoje o slogan é: sobrevivência, sobrevivência, sobrevivência.
“O valor de uma propriedade já não depende apenas da localização, mas da elevação.”
Katharine Mach, cientista do clima e professora da Universidade de Miami.
O mercado imobiliário vive um colapso silencioso. Não porque os preços tenham caído — ao contrário, muitos ainda sobem. Mas porque os alicerces que sustentavam a lógica da compra de imóveis já não resistem às novas marés. Literalmente. Já não basta perguntar se a casa tem boa localização ou potencial de valorização. A pergunta mudou: esta casa sobrevive aos próximos vinte anos?
Em meio ao aquecimento global, o risco climático tornou-se um fator de destruição de valor imobiliário mais poderoso do que recessões ou bolhas especulativas. Fogo na Califórnia, água na Flórida, secas no interior, deslizamentos nas serras. Os mapas de risco não mentem. E os seguros estão deixando de cobrir. O que era refúgio virou armadilha. Investir em imóveis hoje é, muitas vezes, assinar um contrato com o desconhecido — e com o prejuízo.
A política tampouco ajuda. Governadores evitam legislar sobre riscos para não desvalorizar regiões inteiras. Corretores fingem que não viram. E os bancos continuam concedendo crédito como se o clima fosse apenas um detalhe. Mas o detalhe virou destino. A casa dos sonhos pode virar, da noite para o dia, um pesadelo inundado ou em chamas.
Ainda assim, há como agir. O futuro do setor passa por três eixos: transparência climática, reavaliação urbana e tecnologia de resiliência. Precisamos de plataformas públicas que cruzem dados de risco, histórico de desastres e previsão de eventos extremos, acessíveis a compradores e investidores. Precisamos reurbanizar áreas mais seguras, com incentivos reais para migração planejada. E precisamos acelerar a adoção de tecnologias de proteção: micro-habitações móveis, fundações elevadas, isolamento térmico, sistemas de autossuficiência hídrica e energética.
O mercado imobiliário sempre foi sobre localização. Agora é sobre salvação. O imóvel seguro será o novo imóvel valioso. A lógica do metro quadrado precisa dar lugar à lógica do grau Celsius. Como especialista, vejo o colapso — mas também enxergo a reconstrução. A casa do futuro será menos símbolo de status e mais escudo contra o imprevisível. E essa mudança, se guiada com inteligência e coragem, pode tornar o setor mais ético, mais transparente e mais humano.
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