Há uma narrativa que nasce diante dos nossos olhos. Nela, Elon Musk ocupa o centro do palco, não como um engenheiro, mas como um imperador.
A xAI está prestes a arrecadar US$ 9,3 bilhões de investimento, enquanto trocas de farpas com Donald Trump agitam os bastidores. Mas o que realmente está em jogo não é apenas um chatbot irreverente, um novo centro de dados ou uma disputa de egos — é o controle do imaginário digital do século XXI.
O que Musk empreende, ao fundir inteligência artificial, redes sociais e capital de risco — em uma estrutura que se apresenta como libertária mas com potencial de oligopólio — é desenhar uma nova arquitetura de poder. Grok, seu chatbot que promete “buscar a verdade” em vez de “narrativas politicamente corretas”, não é apenas um produto: é um manifesto.
O investimento bilionário que o financia é o tributo de um mercado que prefere ambição a escrúpulo, e que aprendeu a tolerar os surtos públicos de seus profetas desde que eles entreguem escala e retorno.
O ponto cego da notícia está menos nos números e mais no que eles silenciam: a ausência de escrutínio público sobre as regras do jogo. Se xAI vale hoje mais de US$ 100 bilhões sem ainda ter provado sua robustez ética ou impacto social, é porque o capital aprendeu a operar em modo automático. Investidores “passam por cima” das disputas políticas — como a ruptura com Trump — porque o valor agora é medido em poder computacional, não em valores cívicos.
Mas há uma história maior aqui: a do desaparecimento do Estado enquanto fiador do bem comum na era digital. O financiamento de Musk avança, mas onde está o debate democrático sobre o que essa inteligência artificial deve ou não fazer? A Europa discute regulamentação, o Brasil observa, os EUA hesitam — e nesse vácuo, um punhado de bilionários se comporta como se fossem soberanos de um novo império da mente.
É tentador ver Musk como gênio. Mas talvez ele seja apenas o sinal mais visível de um mundo que trocou engenheiros sociais por engenheiros de dados — e trocou perguntas sobre humanidade por respostas algoritmizadas. Em vez de aplaudir o tamanho da rodada, talvez devêssemos perguntar: para quem será esse futuro que está sendo financiado?

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