No jornal semanário português Expresso, quase como curiosidade de rodapé, lemos uma notícia surpreendente: o Banco de Portugal tem a 16ª maior reserva de ouro do mundo. Um detalhe. Mas é justamente nele que está o nervo desta história.
O país luso que ainda se debate com serviços públicos fragilizados, dívida crónica e salários magros, é o mesmo país luso que dorme sobre um tesouro de 382 toneladas de ouro? Esse.
Portugal é um país excepcional, mas podia ser bastante melhor. O brilho desse ouro poderia ajudar, por que não se vê nas ruas, nem nas escolas, nem nos hospitais — está trancado em cofres, rendendo lucros silenciosos à máquina financeira do Estado.
Este ano, esse ouro deu um “bónus” de 8 mil milhões ao banco central. Um presente do acaso, dirão alguns. Mas o acaso, como se sabe, é quase sempre um cálculo bem feito.
Por questões europeia Este ouro não será vendido. Nem investido diretamente em políticas públicas. Ele cumpre um papel simbólico: lastro de credibilidade. Uma espécie de talismã monetário. E no entanto, há algo desconcertante nessa geometria: um país que guarda com zelo um metal precioso, mas hesita em tratar como preciosos os seus cidadãos.
Talvez o detalhe revele o dilema: confiamos mais no valor acumulado do que no valor que podemos criar. Mais no que brilha parado, do que no que se move em carne viva.
O ouro continua onde está. Mas a pergunta fica: para que serve um tesouro nacional que nunca se transforma em bem comum?
Vendê-lo, no entanto, não está em cima da mesa. Parte dele está comprometido com o Eurosistema, outra parte cumpre a função simbólica de lastro de credibilidade. É uma reserva que não se toca porque o gesto de vender seria visto como fraqueza, e não como solução. O ouro não gera empregos, nem paga salários, mas mantém o país bem visto nas planilhas do BCE. É o ativo que todos veneram, mas ninguém ousa mobilizar. Talvez por isso brilhe tanto: porque nunca chega a ser usado.
Ninguém se admire que no Brasil o possam reclamar de volta

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