Trump quer reindustrializar os EUA, mas pode estar apenas isolando o país de um mundo que já não aceita um centro.
As páginas do Wall Street Journal desta quinta-feira trazem o anúncio de uma virada histórica: tarifas altíssimas impostas por Trump a produtos da China, Vietnã, União Europeia e outros países.
A mensagem é clara — a era da globalização, com produção fragmentada e ganhos de escala mundiais, está sob ataque direto.
Trump propõe um “Dia da Libertação” com tarifas base de 10% e picos de até 54% sobre importações, numa tentativa de fazer os EUA voltarem a fabricar dentro de casa, como se o mundo ainda funcionasse com as mesmas engrenagens da década de 1950.
Mas o mundo mudou. A lógica da produção globalizada não foi apenas uma imposição americana, mas uma escolha pragmática de empresas que buscavam eficiência, escala e acesso a mercados.
Agora, os investimentos são pressionados a voltar para os EUA, enquanto gigantes como TSMC, Hyundai, Siemens e Foxconn planejam novas plantas em território americano — não sem hesitação.
A guerra tarifária introduz incertezas, encarece os custos e prejudica a previsibilidade necessária para o capital operar. A retórica protecionista busca restaurar um passado que já não existe. E o risco é o futuro cobrar caro por esse saudosismo.
Sim, também há argumentos a favor do “Made in America”. As cadeias globais são frágeis, como a pandemia deixou claro. Os EUA têm déficits comerciais crônicos e dependem de rivais geopolíticos para bens estratégicos.
“A história da humanidade é, em boa medida, a história das trocas.”
Reindustrializar o país pode gerar empregos e fortalecer a segurança nacional. Mas a questão não está apenas em onde se produz, e sim em como se coopera. Ao transformar aliados em adversários comerciais e ao impor políticas sem coordenação global, os EUA podem até recuperar fábricas, mas perderão o papel de mediador confiável.
Mas a globalização não é uma escolha ideológica: é um fato estrutural. Pode-se ajustar seus mecanismos, regular seus abusos e torná-la mais justa, mas revertê-la é como tentar desligar a internet. Ao tentar derrubar a ordem mundial que ajudou a criar, os EUA arriscam deixar de ser centro — não porque os outros queiram, mas porque já podem.

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